O grande pedagogo é como a natureza: ele
deve acumular obstáculos para que sejam
ultrapassados.
Nietzsche
No pensamento de Nietzsche educação e cultura estão intrinsecamente ligadas. Não há como pensar em um projeto cultural sem, automaticamente, remeter a um projeto educativo. Seguindo a mesma lógica, não existe educação sem uma cultura que a apoie.
Desde já, a educação transmitida nas escolas alemãs era vista, pelo filósofo, como uma cultura aparente, uma pseudo cultura.
Em suas conferências Sobre o Futuro dos nossos Estabelecimentos de Ensino, Nietzsche analisa minuciosamente o sistema educacional de sua época. Percebe que o Estado e os negociantes são os primeiros grandes responsáveis pelo enfraquecimento da cultura. Ambos atrapalham a maturação do indivíduo, determinando uma formação rápida para terem a seu serviço funcionários eficientes e estudantes dóceis, que aprendam a ganhar dinheiro. Da mesma forma, os estudantes são questionados a qual profissão optar e, devido à presa, acabam fazendo más escolhas.
O processo assinalado leva o filósofo a reconhecer duas tendências no sistema educacional de sua época que enfraquece a cultura, a saber: a ampliação máxima da cultura e a redução máxima da cultura.
A primeira tem a pretensão de julgar que o direito à cultura seja acessível a todos. No entanto, é regulamentada pelo dogma da economia política.
A segunda admite a possibilidade de que os indivíduos consagrem sua vida à defesa dos interesses do Estado. Ademais, junto a essas duas tendências, encontra-se a cultura jornalística.
Para Nietzsche, a cultura jornalística vai, pouco a pouco, substituindo a verdadeira cultura. O jornalista, escravo dos três momentos: o presente, as maneiras de pensar e a moda, passa ligeiramente sobre as coisas. Ele escreve sobre os artistas e os pensadores, mas enquanto vive do instante, as grandes obras de artistas e de pensadores emanam do desejo de permanecer, e ultrapassam o tempo pela força da criação.
A educação começa com hábito e obediência, ou seja, com disciplina. Disciplinar significa dar oportunidade para o jovem construir determinados princípios a partir dos quais possa crescer por si mesmo, tornando-se o senhor de seu idioma e possibilitando a construção de uma língua artística a partir dos trabalhos que o precede – caminho para revitalizar a educação e a cultura.
Para Nietzsche, a educação moderna substituiu os verdadeiros educadores, os modelos ilustres, por uma abstração inumana que é a ciência. As universidades, instituições fundamentais de ensino, fizeram da ciência algo desligado da própria vida, tornando os eruditos mais preocupados com a ciência do que com a humanidade, esquecendo que sua verdadeira tarefa é “educar um homem para fazer dele um
homem” (NIETZSCHE, 2003, p.144).
O filósofo crítica arduamente a tendência à ampliação, como sendo uma tentativa de universalização da cultura, procurando estender a educação a maior quantidade de pessoas possível, pensando na educação voltada ao mercado e a subsistência.
Nietzsche enfatiza veementemente, que não há cultura sem o desligamento do mundo das necessidades e que um homem que esteja ligado a essa luta individual pela vida (educação pela sobrevivência) não pode simplesmente dispor de tempo para alcançar a verdadeira cultura.
Aqui cabe a problematização: Onde buscar uma verdadeira formação? Ou melhor, quem seriam os mestres e os guias que mostrariam o caminho que nos levaria à verdadeira cultura?
Por muitos caminhos diferentes e de múltiplos modos cheguei eu
à minha verdade; não por uma única escada subi até a altura onde
meus olhos percorrem o mundo. E nunca gostei de perguntar por
caminhos, – isso, ao meu ver, sempre repugna! Preferiria perguntar
e submeter à prova os próprios caminhos. Um ensaiar e perguntar
foi todo o meu caminhar – e, na verdade, também tem-se de
aprender a responder a tal perguntar! Este é o meu gosto: não um
bom gosto, não um mau gosto, mas o meu gosto, do qual já não
me envergonho nem o escondo. “Este – é meu caminho, – onde
está o vosso?”, assim respondia eu aos que me perguntavam “pelo
caminho”. O caminho, na verdade, não existe! (NIETZSCHE,
2002, p.272).
Neste cenário, Nietzsche apresenta a ideia de educador ao qual o jovem estudante poderá tomar como exemplo para si, como a melhor forma de encontrar a si próprio. Os mestres teriam a função de propiciar ao sujeito encontrar o seu próprio caminho, sendo que, a educação acontece, então, a partir do modelo ou exemplo de vida fornecido pelo mestre, e não pela simples transmissão de conhecimentos.
O papel da educação é promover o homem superior. A educação não deve padronizar, mas destacar os indivíduos mais talentosos.
Inspirado em Arthur Schopenhauer (1788-1860), Nietzsche afirma que o papel do mestre é o comprometimento com uma educação vivencial, não formal. Seguindo esta lógica argumentativa, a escola não deve mais se preocupar com a administração da vida, mas, antes, com a fecundação da vida, com a criação de um espírito artista.
Acerca da crítica de Nietzsche à filosofia universitária, podemos afirmar que, para Schopenhauer não existem filósofos na universidade, mas professores que vivem da filosofia, atraídos por seus interesses materiais e no que convém ao Estado e à religião.
Nietzsche resgata e aprofunda as críticas de Schopenhauer quanto à relação da filosofia com o Estado e a cultura histórica. Ademais, como Schopenhauer, cogita que não existem filósofos universitários, mas somente professores de filosofia como engrenagens úteis à sobrevivência da máquina estatal. Outrossim, para Nietzsche (2003), o filósofo universitário pode ser visto como um anti-sábio. É um filósofo do Estado, da religião, colecionador dos valores em curso e funcionário da história; mascara-se com a filosofia para sobreviver.